quarta-feira, 29 de junho de 2011

Grécia: Crise e Manifestações sociais

O Parlamento da Grécia aprovou na tarde desta quarta-feira (29) as polêmicas medidas de austeridade exigidas pelos credores internacionais do país, em meio a novos violentos protestos de rua que deixaram feridos em Atenas.
O pacote conseguiu 155 votos, contra 138 contrários, em um universo de 300 parlamentares.
Pouco antes do início da votação, o premiê George Papandreou havia reafirmado, na tribuna do Parlamento, que o país vai fazer o possível para evitar o calote da dívida e o colapso do país "a qualquer custo". O fato é que para evitar a crise do país e consequentemente dos banqueiros que já emprestaram bilhões para o país atingirá a classe trabalhadora que acabará sendo mais uma vez vítima das decisões políticas enraizadas no modelo capitalista.
O novo pacote inclui demissão de 25% dos funcionários públicos; elevação da jornada de trabalho para 40 horas semanais; novos contratos com um salário mínimo de 500 euros mensais apenas; aumento de impostos e a privatização de quase todas as importantes empresas estatais do país.
A pressão dos banqueiros internacionais aumentou depois que, no início desta semana, banqueiros e o governo francês chegaram a um acordo sobre os termos em que um novo empréstimo poderia ser feito ao governo grego.
Com isso o primeiro-ministro George Papandreou, exigiu ao Parlamento na noite de segunda-feira para que os deputados exercessem seu “dever patriótico” e aprovassem o corte proposto para manter evitar a crise financeira no país.
O medo da falência do país não é propriamente da população trabalhadora grega, e sim dos banqueiros, os maiores interessados em impedir que as contas públicas da Grécia atinjam o fundo do poço com consequências desastrosas para o sistema financeiro internacional.
No entanto, como gosto de ressaltar o capitalismo é contraditório, e as lutas sociais são reflexos dessa contradição. A recessão em marcha na Europa é um dos principais fatores de crise associados à proposta de cortes ainda maiores nos gastos estatais. Para os banqueiros, no entanto, trata-se de uma corrida aos cofres públicos do país, deixando a população à míngua enquanto procuram proteger seus próprios interesses.
A crise está inerente ao capitalismo, no entanto quando a classe trabalhadora sente-se prejudicada esta se une contra esse sistema. A onda de greves na Grécia, um desdobramento das lutas operárias e populares nos demais países, é a confirmação prática de que os trabalhadores estão decididos a impedir que os patrões e banqueiros os façam pagar pela crise que eles mesmos criaram.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Anistia é para os perseguidos e não para os perseguidores!

A anistia é uma forma jurídica, legal, concedida geralmente aos cidadãos que por motivações políticas praticaram determinadas infrações penais, comum no marco de períodos de crises políticas e sociais agudas, tornando extinta sua punibilidade ou fazendo cessar qualquer efeito das condenações sobre os acusados.
Trata-se de uma norma ou instituto jurídico bastante antigo na História da humanidade, tendo aparecido principalmente na Grécia antiga durante as reformas de Sólon em 594 a.C.
No Império Romano também existia uma figura semelhante, o generalis abolitio, com o mesmo objetivo de conceder o “perdão” ou remissão ao criminoso. Na Idade Média, houve um certo recrudescimento desse instituto, mas com a Revolução Francesa de 1789 voltou a se desenvolver como princípio político na maioria das constituições burguesas. 
Durante a história política brasileira, marcada por centenas de revoltas, insurreições e movimentos populares de luta desde a época colonial, embora tenha sido muito pouco respeitada pelos governos, também sempre esteve colocada a possibilidade de concessão de anistia como ocorreu, por exemplo, nas revoltas da Cabanagem, da Revolução Farroupilha, a Sabinada, a Revolução Praieira, na Revolta Popular da Vacina, na Revolta da Chibata, nas greves operárias de 1917 em São Pauloetc. A reivindicação de anistia geral a esses movimentos esteve presente como garantia fundamental em todas as negociações.  
A lei de anistia e a greve dos bombeiros
Em um caso recente, a greve dos bombeiros do Rio de Janeiro, a reivindicação de anistia foi novamente levantada pelo movimento, que reivindica anistia total para os grevistas que foram presos e estão sofrendo agora processo disciplinar interno, além de uma ação penal militar pelos crimes de motim, dano em material ou aparelhamento de guerra e quebra de hierarquia. 
A idéia da anistia, portanto, tem um significado eminentemente político, é um recurso de defesa dos oprimidos com o objetivo de absolver os crimes e processos decorrentes das lutas que as massas e os movimentos populares empenharam contra os regimes de exploração e repressão das classes dominantes. É uma forma de reintegrar as garantias e direitos políticos aos cidadãos perseguidos por esses regimes.
A manobra para deixar impune os opressores foi criada na Ditadura Militar
A Lei de Anistia 6.683 promulgada no governo militar de Figueiredo, em agosto de 1979, é, nesse sentido, uma aberração jurídica total, pois é uma caricatura do que seria uma verdadeira anistia.
Segundo o texto de Lei n° 6.683/79, promulgado ainda em plena vigência do regime militar:
“Art. 1º É concedida anistia a todos quantos, no período compreendido entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979, cometeram crimes políticos ou conexo com estes, crimes eleitorais, aos que tiveram seus direitos políticos suspensos e aos servidores da Administração Direta e Indireta, de fundações vinculadas ao poder público, aos Servidores dos Poderes Legislativo e Judiciário, aos Militares e aos dirigentes e representantes sindicais, punidos com fundamento em Atos Institucionais e Complementares.
§ 1º - Consideram-se conexos, para efeito deste artigo, os crimes de qualquer natureza relacionados com crimes políticos ou praticados por motivação política.
§ 2º - Excetuam-se dos benefícios da anistia os que foram condenados pela prática de crimes de terrorismo, assalto, seqüestro e atentado pessoal. [...]”
A lei não representou a anistia ampla e geral que se reivindicava, pois muitos presos políticos, inclusive condenados a prisão perpétua, não foram libertados, acusados por crimes de “terrorismo”, “subversão” etc., isto é, crimes claramente de natureza política, sendo libertados apenas posteriormente, depois de uma enorme pressão.  
A idéia de crime “conexo” foi o que deu ensejo a uma interpretação maliciosa dos juízes, porém completamente estúpida do ponto de vista jurídico, para ampliar a anistia aos agentes do governo. 
Na doutrina penalista, resumidamente, crime conexo é a ligação que há entre a mesma finalidade de um ato em relação ao principal, guardando uma relação de causa e efeito ou uma identidade de fins entre as duas condutas delituosas, como é o caso dos crimes políticos contra um regime de exceção. No caso da ditadura, não há nenhuma interpretação séria que possa dar um caráter bilateral a anistia.
Simplesmente não existe crime conexo aplicado a tortura, assassinatos, desaparecimentos etc., cometidos pelos agentes governamentais da ditadura militar brasileira contra seu próprio povo, para suprimir qualquer oposição. Pelo contrário, a tortura, por exemplo, é crime comum, imprescritível, constitui prática repugnante, abominável, covarde, um crime contra a humanidade, segundo as Convenções e Tratados Internacionais dos quais o governo do Brasil é signatário.
A própria Constituição Brasileira de 1988, mesmo com todas as suas limitações, considera crime inafiançável, imprescritível e “insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura”.
O parecer do STF, do advogado-geral da União, Luís Inácio Adams e a capitulação da presidente Dilma Rousseff e do Partido dos Trabalhadores diante da pressão da direita e dos militares, garantiu o sigilo eterno dos documentos da ditadura e permitiu que os ditadores anistiassem a si próprios, ou seja, abriu-se aqui o precedente que garante a impunidade completa de todos os regimes de exceção no mundo inteiro, pois se a lei de anistia da maneira como foi formulada é a última palavra sobre o assunto, tendo mais legitimidade para julgar os crimes cometidos pela ditadura que o suposto regime democrático posterior, então bastaria que Alemanha nazista sob o comando de Hitler promulgase uma lei anistiando o III Reich e a Gestapo, ou a Itália fascista de Mussolini, ou o Franquismo na Espanha e assim por diante, para que ninguém sofresse nenhum processo ou julgamento pelas atrocidades que cometeram.         
É direito de todo cidadão se levantar contra as arbitrariedades de um governo tirânico que não representa os interesses de seu povo, que impõem um regime de exploração e opressão e persegue duramente seus opositores, todas as ações praticadas pelas organizações, grupos, partidos ou indivíduos são legítimas como forma de combater a arbitrariedade das classes dominantes, o contrário é absurdo.
O desfecho do caso é um fiasco completo para um Estado que se pretende democrático e de Direito: permitir que seja garantida a impunidade aos agentes do governo de um regime que cometeu graves violações aos “direitos humanos” revela a farsa que é o democracia brasileira.
A lei da anistia no Brasil, graças a uma manobra da burguesia, junto com a Igreja Católica e outros setores reacionários da pequena-burguesia, serviu na realidade para estabelecer uma transição de uma ditadura militar franca, aberta, que naquele momento estava numa crise terminal colocada em xeque pelas mobilizações operárias e estudantis, para um regime pseudo-democrático, preservando o poder de uma determinada camada da burocracia militar em pontos-chave do Estado e inocentando os torturadores e assassinos. 
Os trabalhadores, as organizacões operárias, estudantis, camponesas e democráticas devem ter claro que a única forma de se opor ao acordo que foi feito entre a direita, a “esquerda” e os militares que ainda governam o País, e de fato punir os assassinos e torturadores da ditadura é por meio da luta dos oprimidos e dos setores que se colocam contra esse regime, a luta por um governo próprio dos oprimidos, um governo baseado nas organizações operárias e populares, da cidade e do campo, a serviço dos interesses da maioria da população contra a minoria parasitária e opressora que domina o País.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Gerson Teixeira: agravamento da concentração das terra

Por Gerson Teixeira
Ex-presidente da Associação Brasileira de Reforma 
Agrária (Abra) e integrante do núcleo agrário do PT

Desde as suas origens, notadamente com o regime de sesmarias e com a Lei de Terras de setembro de 1850, a concentração da propriedade fundiária no Brasil foi ampliada e consolidada como marca ao que parece indissolúvel da nossa história. Tanto que o século XXI iniciou com a notícia do IBGE sobre a imutabilidade, nos vinte anos até 2006, dos níveis da concentração da terra no país, conforme apurado pelo último Censo Agropecuário.
Os fatores relacionados à frouxidão dos controles e dos marcos regulatórios sobre o acesso à terra representam o padrão institucional brasileiro graças ao qual foram se constituindo e consolidando a assimetria e demais anomalias na estrutura de posse e uso da terra no Brasil.
Graças a essa marca, fruto da forte influência política das classes dos grandes proprietários rurais, se mantém no Brasil o anacronismo das Leis e normas brasileiras pelo qual são admitidas permissividades descabidas a exemplo da possibilidade concreta do acesso sem limites à propriedade fundiária. Isto, em que pese aparentes vedações ou limites presentes na Constituição de 1988. Contudo, originariamente sem eficácia ou não implementadas.
No primeiro caso, por conta dos efeitos de outros dispositivos conflitantes no próprio Estatuto Federal, ou por reinterpretações judiciais; no segundo, por razões até grotescas. Dentre estas, cite-se o discurso utilizado para justificar o não cumprimento do art. 51, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (C.F/1988), vinculado ao disposto no art. 49, XVII, da CF de 1988, que fixa a aprovação prévia pelo Congresso Nacional, da alienação ou concessão de terras públicas com área superior a dois mil e quinhentos hectares. Pelo referido dispositivo foi definida a revisão,
“..pelo Congresso Nacional, através de Comissão mista, nos três anos a contar da data da promulgação da Constituição, todas as doações, vendas e concessões de terras públicas com área superior a três mil hectares, realizadas no período de 1º de janeiro de 1962 a 31 de dezembro de 1987. Instalada e executada a CPMI, a pretendida revisão, sem qualquer resultado, levou o Relator ao seguinte desabafo, no seu Relatório: “Não há, portanto, como fugir à triste conclusão com que fechamos este Relatório, qual seja, a de que, sem o necessário aparelhamento do Congresso para cumprimento de missões de tal porte, estaremos condenados ao sentimento de frustração, inevitável a todos quantos para cá vierem imbuídos pelo ideal de bem servir. ”(1) 
Outra restrição legal aparente à posse ilimitada da terra no Brasil reside na condição imposta pelo art. 5º, XXIII, da Constituição. Pelo texto deste dispositivo, o direito de propriedade está condicionado ao cumprimento da função social. Todavia, o art. 185 do mesmo Estatuto Federal, na prática, revoga tal condição quando torna a propriedade produtiva imune à desapropriação. Ou seja, sendo produtiva, condição bastante fácil de caracterização no Brasil (2) , a grande propriedade pode descumprir os demais graus e requisitos para o cumprimento da função social e, ainda assim, estará imune à desapropriação (3) .
No contexto do ambiente institucional acima, o Incra, por meio das Estatísticas Cadastrais de 2010, detectou indícios de agravamento, nos últimos anos, do quadro de concentração da terra no Brasil, marcadamente na região Norte. Ou, para ser mais preciso: na Amazônia, o território de expansão do agronegócio.Essa possibilidade está retratada no confronto desses dados com os seus equivalentes de 2003.
O presente texto está focado para efetuar essa análise com o concurso de parte dos dados das Estatísticas Cadastrais do Incra, objetivando aferir os indícios desse processo. Nesses termos, o documento não é definitivo. Serão necessários estudos cientificamente mais criteriosos para o diagnóstico final a respeito por conta, entre outros procedimentos, da necessidade de maior crítica e depuração de eventuais desvios da fonte dos dados.
Considere-se, em especial, o caráter declaratório do Cadastro do Incra, o que, no caso do Norte (ou da Amazônia), pode ter estimulado “corrida declaratória” nos últimos anos pelas expectativas geradas pelas ações (ou promessas) federais de regularização fundiária na região.
A propósito, conforme se previa, ressalvadas as controvérsias políticas do ‘Programa Terra Legal’, este não tem logrado eficácia até o momento por uma razão simples, afora as de natureza operacionais e de gestão: o instrumento pretende referendar posses sem litígio (mansas e pacíficas) em uma realidade fundiária forjada nos conflitos e desvios em todos os níveis.
Está admitido, pois, o caráter exploratório deste texto. Porém, é mais que tangível a possibilidade de um movimento de aprofundamento da concentração da posse da terra no Brasil, localizadamente no Norte/Amazônia.
Os dados do Incra mostram consistência com o inegável potencial impactante sobre a estrutura fundiária da Amazônia, no caso, de fatores internos e externos que adquiriram relevo desde a década passada.
Em um ambiente de flancos regulatórios, provavelmente esses fatores vêm, de fato, provocando expressivo fenômeno de corrida pela terra e pelos bens ambientais no Brasil e, mais especificamente, na Amazônia.
Entre tais fatores, destacamos a “opção brasileira”, reforçada nos anos recentes, pela transformação do país em um grande protagonista no comércio internacional de commodities minerais e agrícolas, incluindo os agrocombustíveis.
No caso agrícola, integra as medidas nessa direção, o expressivo reforço às políticas de estímulos creditícios, tributários e fiscais para a agricultura produtivista; os incentivos para a atração de capital externo para segmentos nobres do agronegócio; e os estímulos para a criação de empresas brasileiras de ‘classe mundial’. Vale sublinhar, ainda, as medidas institucionais, efetivadas ou, em curso, nas esferas fundiária e ambiental, visando a remoção de constrangimentos estruturais para a expansão da grande exploração agrícola.
Ao mesmo tempo, e associadamente, incitam, também, o referido processo, as repercussões fundiárias da procura de terras no país pelo capital externo, movida: (i) pela aposta no mercado global do etanol; (i) para os investimentos das “papeleiras”; (iii) pelo estado de vulnerabilidade da oferta alimentar por conta de sistemáticas quebras de safra em todo o mundo provavelmente já refletindo os efeitos das mudanças climáticas; e (iv) pelas apostas na atratividade dos instrumentos de mercado decorrentes dos Acordos no âmbito da COP do Clima.
Não é possível estimar, com confiabilidade, a escala desse recente movimento de ‘tomada de terras’ no Brasil, pelo capital estrangeiro, em função do descontrole e liberalidade dominante, em parte contidos em 2010 por Parecer da AGU, acolhido pelo Presidente Lula.
O texto disponibiliza um sumário comparativo nacional das duas posições consideradas das Estatísticas Cadastrais com o auxílio de algumas das suas variáveis mais comuns. Em seguida, expomos Tabelas com comentários sobre os respectivos dados, por região do país. Por último, apresentamos uma Tabela (anexo), com os dados gerais por Unidade Federada para 2003 e 2010, sem qualquer análise, mas com a inclusão de uma série de variáveis que permitem os respectivos exercícios comparativos.
2.Aspectos Metodológicos
A base do Sistema Nacional de Cadastro Rural – SNCR envolve as informações cadastrais coletadas, declaradas pelo detentor do imóvel rural e/ou seu representante legal, no último Recadastramento realizado pelo INCRA, em 1992, e pela manutenção cadastral feita com base nos pedidos de atualização cadastral efetuados durante os anos posteriores. No caso, as atualizações de outubro de 2003, e de 26 de janeiro de 2010.
Do tratamento da base de dados do cadastro de imóveis rurais, a opção foi a de restringir a abordagem via a utilização das categorias de classificação fundiária que orientam as políticas agrárias, a saber: minifúndio, pequena propriedade, média propriedade e grande propriedade (4) .
O minifúndio foi instituído no Inciso IV, do art. 4º, da Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964 e definido no art. 22, inciso I, do Decreto nº 84.685/1980, como o imóvel rural de área inferior a um módulo fiscal (5) .
A pequena propriedade encontra-se definida no Inciso II, do art. 4º, da Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, como o imóvel rural com área entre 1 e 4 módulos fiscais. A média propriedade, conceituada no Inciso III, do art. 4º, da Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, é o imóvel rural com área superior a 4 módulos fiscais e até 15 módulos fiscais.
A mencionada legislação omitiu a definição da grande propriedade, a qual, no entanto, passou a ser tida na prática das políticas agrárias como o imóvel rural com área superior a 15 módulos fiscais.
Procuramos sintetizar as informações específicas sobre a estrutura fundiária, agregando-as pelas seguintes variáveis:
•    O número e área dos imóveis rurais por cada uma das categorias antes colocadas;
•    No caso da grande propriedade, desagregamos as informações apresentando os dados sobre a ‘propriedade produtiva’. Isto, com o propósito de demonstrar a evolução dos seus níveis de utilização produtiva, ou do grau de ociosidade.
Foram excluídos do banco de dados gerado, os imóveis "não classificados”, em decorrência do art. 7º da Lei nº 8.629/93, pois usam dessa prerrogativa, por estarem sendo objeto de implantação de projeto técnico. Por razões óbvias, também não foram incluídos os ‘imóveis inconsistentes’, à medida que registraram incorreções constatadas nas informações básicas constantes da Declaração de Cadastro apresentada.

3. O Quadro Comparativo da Estrutura Fundiária no Brasil – 2003/2010
Conforme colocado, desconsideramos, nas estatísticas do Incra, os imóveis não classificados, e os inconsistentes, cujas áreas totais no Brasil somam cerca de 3.5 milhões de hectares no caso da Atualização de 2010. Portanto, consideramos para o confronto proposto, os imóveis classificados pelo próprio Incra, e conforme a legislação, nas categorias de minifúndio, pequena, média, grande propriedade e grande produtiva.
Vale esclarecer que, para a grande propriedade produtiva, o indicador utilizado de participação da área, diversamente das demais categorias, está relacionado à área da grande propriedade, e não, à área total dos imóveis.
Feitos esses esclarecimentos, a Tabela 1 apresenta a posição agregada nacional para as categorias cima, nas posições de 2003 e 2010:
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Das Tabelas acima, são possíveis conclusões como:
**** o número de imóveis rurais cresceu de 4.288.672, em 2003, para 5.167.476, em 2010, e as respectivas áreas cadastradas, de 416.112.784 hectares, para 568.258.741 hectares (36.5%).
**** As áreas de todas as categorias apresentaram variação positiva, sendo as grandes propriedades as que apresentaram o maior incremento: 48.4%, taxa que resultou da incorporação adicional, por essa categoria, de 104 milhões de hectares, dos quais, 73 milhões de hectares, ou 70%, na região Norte. Ao se considerar o território da Amazônia Legal (neste caso incluindo inadequadamente, para simplificação, todo o estado do Maranhão), conclui-se que praticamente a área ampliada das grandes propriedades, de 2003 a 2010, ocorreu naquela região, conforme demonstramos na sequência.
**** Esse acréscimo de área das grandes propriedades correspondeu a 68% do acréscimo geral das áreas dos imóveis rurais no período, de 152 milhões de hectares
**** Com os resultados acima, em 2010, as grandes propriedades passaram a deter 56.1% da área total dos imóveis contra 51.6% em 2003.
**** As demais categorias sofreram redução na participação das áreas respectivas nas áreas totais:
**** Minifúndio: de 9.4%, para 8.2%;
**** Pequena: de 17.8%, para 15.6%;
**** Média: de 21.2%, para 20%;
**** Já, a participação das áreas produtivas das grandes propriedades declinou de 37.7% em 2003, para 28.3%, fato obviamente sugestivo do aumento relativo do grau de ociosidade nos grandes imóveis.

4. O Quadro por Região
Região Norte – Com base na Tabela 2, assim resumimos as alterações de 2003 para 2010:
**** A área total cadastrada experimentou aumento expressivo de 90.5% no período. Portanto, praticamente dobrou, de 2003 a 2010;
**** Grandes propriedades: crescimento da área, de 133%, passando de 54.8 milhões de hectares em 2003, para 127.8 milhões de hectares.
**** Médias propriedades: ampliação da área, em 33% (4.6 milhões de hectares)
**** Pequenas: aumento de 2 milhões de hectares
**** Minifúndios: aumento de 1.2 milhão de hectares.
**** No entanto, ainda que tenha ocorrido a expansão absoluta de áreas para todas as categorias, quando se considera a participação da área de cada uma delas, em relação às áreas totais dos imóveis rurais, somente as grandes propriedades tiveram incremento. Representavam 61% das áreas em 2003 e passaram para 75% em 2010.
As demais tiveram as seguintes reduções:
**** Minifúndio: de 8.4% para 5.1%;
**** Pequena Propriedade: de 15% para 9%;
**** Média Propriedade: de 15.5% para 11%;

**** Na Amazônia (incluindo todo o MA), a área cadastrada aumentou de 177 milhões de hectares para 284 milhões de hectares (107 milhões ha, ou 61%)
**** Dos 107 milhões há ampliados, 90 milhões, o equivalente a 84% dessa expansão de área, se deu na categoria das grandes propriedades
**** Considerando a participação de área de cada categoria com as respectivas áreas totais dos imóveis em 2003 e 2010, o quadro é o seguinte:
**** minifúndios: participação caiu de 8.2% para 4.6%
**** pequenas propriedades: detinham 12.8% da área e declinaram para 9.8%
**** médias propriedades: de 18% em 2003 passou para 14.7% em 2010
**** grandes propriedades: a única categoria que teve incremento na participação na área, subindo de 63% para 71%.
 
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Região Nordeste - com Base na Tabela 3, assim resumimos o quadro no NE:
**** A área total cadastrada aumentou 30% no período;
**** A categoria que teve maior ganho de área foi a grande propriedade: 37% seguida pela média, com 36%
**** A participação da área produtiva sobre a área das grandes diminuiu de 21% para 17%
**** em relação à variação ocorrida na participação das áreas de cada categoria nas respectivas áreas totais, o quadro foi o seguinte:
**** Minifúndio: queda de 16% para 14.7%
**** Pequena Propriedade: queda de 24% para 22%
**** Média: aumento de 23% para 24%
**** Grande: aumento de 39% para 39%
**** A área produtiva das grandes propriedades foi reduzida de 21% para 17%

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Região Sudeste – nessa região, o crescimento das áreas de médias e pequenas propriedades (24.5% e 18.6%), bem acima ao das grandes (6.6%), teria constituído fato positivo na direção de uma maior simetria fundiária, não fosse o incremento significativo das áreas de minifúndios (24.2%);
Quando se coteja a participação das áreas de cada categoria nas áreas totais dos imóveis rurais nos anos correspondentes, tem-se que a pequena se manteve estável (25%); a média cresceu de 28% para 30%; os minifúndios, de 10.7% para 11.4%; e as grandes tiveram redução de 35.6% para 32.6%.
A área total produtiva das grandes propriedades que correspondia a 58.8% da área total das grandes em 2003, caiu para 54.5% em 2010. (Tabela 4)
 
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Região Sul - com Base na Tabela 5, destacamos no quadro no Sul:
**** a área cadastrada dos imóveis rurais cresceu 24% no período;
**** a média propriedade foi a categoria que teve a maior expansão de área (36%), seguida da grande, 23%.  Em seguida, o minifúndio cuja área cresceu 20%. O crescimento de área das pequenas foi de 18%;
**** a fração produtiva das grandes propriedades cresceu de 57.3% para 68.5%;
**** em termos de participação da área de cada categoria nas áreas totais dos imóveis, houve a manutenção dos minifúndios (17%) e das grandes (33%); a pequena redução das pequenas (de 30% para 29%); e a discreta ampliação das médias (de 20% para 22%).

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Região Centro-Oeste – alguns pontos a destacar:
**** Crescimento da área cadastrada: 18.5%;
**** Todas as categorias tiveram incorporaram área; a média principalmente (36.3%); grande (23.2%); grande produtiva (47.3%); pequena (18.1%) e minifúndio (20.2%);
**** As grandes controlam 67.3% da área total dos imóveis rurais da região (Tabela 6) 

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Apresentamos, na seqüência, estimativa sobre o potencial de aplicação do instrumento da desapropriação para fins sociais no Brasil e regiões.
A exemplo do procedimento na versão original, a estimativa acima foi feita considerando a evolução dos dados entre os anos de 2003 e 2010, com base nas respectivas Estatísticas Cadastrais do Incra.
Para tanto, calculamos o número e área das grandes propriedades improdutivas a partir da subtração, dos dados correspondentes das grandes propriedades, aqueles especificados para as grandes produtivas, assim classificadas pelo próprio Incra nos termos da legislação citada no texto anterior.
Vale lembrar que não estamos tratando de grandes propriedades que descumprem a função social e, sim, daquelas que sequer cumprem os baixos requisitos de produtividade. Pela legislação em vigor, somente podem ser desapropriadas para fins sociais as grades propriedades improdutivas.
Observemos os dados da Tabela abaixo:

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Algumas conclusões possibilitadas pela Tabela:
**** No Brasil, existem 69.2 mil grandes propriedades improdutivas; portanto, passíveis de desapropriação, com área equivalente a 228.5 milhões de hectares
**** em relação ao ano de 2003, essas posições de3 2010 representaram incrementos de 18.7% no número de imóveis e de 70.8% na área
**** sintomaticamente, em que pese o maior crescimento de área das grandes improdutivas ter ocorrido no Norte do país (155.5%), em termos de número de imóveis, o maior incremento ocorreu na região Sul do Brasil. Em 2003 havia naquela região 5.413 imóveis classificados como grandes improdutivas. Em 2010 esse número passou para 7.139, o que correspondeu a uma expansão de 32% contra 30% no Norte. Há, no Sul, 5.3 milhões hectares de áreas improdutivas em grandes propriedades;
**** em todas as regiões foi observado o crescimento do número de imóveis e áreas das grandes propriedades improdutivas
**** Por fim resta informar que das 130.5 mil grandes propriedades cadastradas em 2010, com área de 318.9 milhões hectares, 23.4 mil com área de 66.3 milhões de hectares não têm a propriedade reconhecida. Ou seja, são imóveis detidos à título precários, i.e, objeto de posse ou misto.
**** Portanto, há um amplo território em todas as regiões do país para a execução da reforma agrária com obtenção via desapropriação, sem ameaçar a “eficiência” da grande exploração do agronegócio. #

1-  Fonte: Resposta da Secretaria do Congresso Nacional à solicitação interna de informações sobre o tema por parte do Deputado Federal Beto Faro (PT/Pa).
2-  Os parâmetros referenciais da mensuração do Grau de Utilização – GU, e do Grau de Eficiência das Explorações – GEE, têm como base os dados da agropecuária brasileira de 1975. Ou seja, no Brasil, a grande propriedade produtiva é assim classificada, hoje, quando observa os índices de rendimentos agropecuários de 35 anos atrás.
3-  Pelo art. 186, da C.F, a função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: I - aproveitamento racional e adequado; II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho; IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.
4-  As Estatísticas Cadastrais também disponibilizam as informações por classes de área em hectares e em módulos fiscais. E, no caso da base de dados de 2010, oferecem essas informações desagregadas, ou agregadamente pelas três esferas da federação, Amazônia Legal, grandes regiões, etc...
5-  O módulo fiscal, criado originalmente para fins tributários. Está definido no § 2º, do art. 50 da Lei 4.504, de 30 de novembro de 1964, com as alterações introduzidas pela Lei 6.746, de 10 de dezembro de 1979, regulamentada pelo Decreto nº 84.685, de 06 de maio de 1980. Diz o mencionado dispositivo do Art. 50: “O Módulo Fiscal de cada Município, expresso em hectares, será determinado levando-se em conta os seguintes fatores:    
a) o tipo de exploração predominante no Município:        
I - hortifrutigranjeira;            
II - cultura permanente;            
III - cultura temporária;            
IV - pecuária;            
V - florestal;            
b) a renda obtida no tipo de exploração predominante;        
c) outras explorações existentes no Município que, embora não predominantes, sejam expressivas em função da renda ou da área utilizada; e    
d) o conceito de "propriedade familiar", definido no item II do artigo 4º desta Lei.
Posteriormente, com a edição da Lei nº 8.629, de 25/02/1993, o Módulo Fiscal passou a ser utilizado para a classificação fundiária do imóvel, quanto ao tamanho da propriedade, conforme definido no artigo 4º da referida Lei.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Charge: A transformação de Lula

UMA METAMORFOSE POLÍTICA

O chamado milagre econômico brasileiro foi acompanhado de muitas "explosões", dentre elas um crescimento contínuo das classes médias, primeiro nas grandes cidades e depois nas cidades menores e no campo modernizado. Como essa expansão foi acelerada, é lícito falar em explosão das classes médias, que, neste meio século, acompanha a explosão demográfica, a explosão urbana e a explosão do consumo e do crédito. 

Esse conjunto de fenômenos tem relação com o aumento da produção industrial e agrícola, como também do comércio, dos transportes, das trocas de todos os tipos, das obras públicas, da administração e da necessidade de informação. Há, paralelamente, uma expansão e diversificação do emprego, ainda que uma parcela importante dos que se dirigiram às cidades não pudesse ser assalariado formal, só encontrando trabalho no circuito inferior da economia.

Um sentimento de segurança é infundido na classe média pelos programas governamentais que lhe facilitam a aquisição da casa própria, programas de que foram os beneficiários privilegiados, enquanto os brasileiros mais pobres apenas foram incompletamente
atendidos nos últimos anos do regime autoritário.

Vale realçar que no Brasil do milagre, e durante boa parte dos anos 80, a classe média se expandiu e se desenvolveu sem que houvesse verdadeira competição dentro dela quanto ao uso dos recursos que o mercado ou o Estado lhe ofereciam para a melhoria do seu poder aquisitivo e do seu bem-estar material. Daí a sua relativa coesão e a consciência de haver tornado um poderoso estamento. A competição é, na realidade, com os pobres, cujo acesso aos bens e serviços torna-se cada vez mais difícil, na medida em que estes se multiplicam e diversificam. A classe média é a grande beneficiária do crescimento econômico, do modelo político e dos projetos urbanísticos adotados.

Tudo o que alimenta a classe média dá-lhe, também, um sentimento de inclusão no sistema político e econômico e um sentimento de segurança, estimulado pelas constantes medidas do poder público em seu favor. Tratava-se, na realidade, de uma moeda de troca, já que a classe média constituía uma base de apoio às ações do governo. Tal classe média, ao mesmo tempo em que se diversifica profissionalmente, aumenta o seu poder aquisitivo e melhora qualitativamente, por meio das oportunidades de educação que lhe são abertas, tudo isso levando à ampliação do seu bem-estar (o que hoje se chama de qualidade de vida), conduzindo-a a acreditar na garantia de preservação das suas vantagens e perspectivas.

Forma-se, dessa maneira, uma classe média mais apegada ao consumo que à cidadania, sócia despreocupada do crescimento e do poder, com os quais se confundia. Eram essas, aliás, condições necessárias a um crescimento econômico sem democracia. Quando esta se instala incompletamente nos anos 80, guarda esses vícios de origem, sustentando um regime representativo falsificado pela ausência de partidos políticos consequentes. Seguindo essa lógica, as próprias esquerdas são levadas a dar mais espaço às preocupações eleitorais e menos à pedagogia propriamente política.

Tal situação tende agora a mudar, quando a classe média começa a conhecer a experiência da escassez, o que poderá levá-la a uma reinterpretação de sua situação. Nos anos recentes, primeiro de forma lenta ou esporádica e já agora de modo mais sistemático e continuado, a classe média conhece dificuldades que lhe apontam uma situação existencial bem diferente daquela que conhecera há poucos anos.

Tais dificuldades chegam num tropel: a educação dos filhos, o cuidado com a saúde, a aquisição ou o aluguel da moradia, a possibilidade de pagar pelo lazer, a falta de garantia no emprego, a deterioração dos salários e o crescente endividamento estão levando ao desconforto quanto ao presente e à insegurança quanto ao futuro, tanto o futuro remoto quanto o imediato. Tais incertezas são agravadas pelas novas perspectivas da previdência social e do regime de aposentadorias, da prometida reforma dos seguros privados e da legislação do trabalho. A tudo isso se acrescentam, dentro do próprio lar, a apreensão dos filhos em relação ao seu futuro profissional e as manifestações cotidianas desse desassossego.

Já que não mais encontram os remédios que lhe eram oferecidos pelo mercado ou pelo Estado como solução aos seus problemas individuais emergentes, as classes médias ganham a percepção de que já não mandam, ou de que já não mais participam da partilha do poder. Acostumadas a atribuir aos políticos a solução dos seus problemas, proclamam, agora, seu descontentamento, distanciando-se deles. Instalam-se num desencanto mais abrangente quanto à política propriamente dita, justificado, em parte, pela visão de consumidor desabusado de que se alimentou durante décadas, agravada com a fragmentação pela mídia, sobretudo televisiva, da informação e da interpretação do processo social. Tudo isso fortalece nas classes médias a certeza de não mais influir politicamente, levando-as, não raro, a reagir negativamente, isto é, a desejar menos política e menos participação, quando a reação correta poderia e deveria ser exatamente a oposta.

É certo, pois, que a atual experiência de escassez não conduza necessariamente à desejável expansão da consciência. Quando esta se impõe, não o faz igualmente, segundo as pessoas. Visto esquematicamente, tal processo pode ter, como um primeiro degrau, a preocupação de defender situações individuais ameaçadas e que se deseja reconstituir, retomando o consumo e o conforto material como o principal motor de uma luta, que, desse modo, pode se limitar a novas manifestações de individualismo.

É num segundo momento que tais reivindicações, fruto de reflexão mais profunda, podem alcançar um nível qualitativo superior, a partir de um entendimento mais amplo do processo social e de uma visão sistêmica de situações aparentemente isoladas, levando à decisão de participar de uma luta pela sua transformação, quando o consumidor assume o papel de cidadão.

Seja como for, as classes médias brasileiras, já não mais aduladas e feridas de morte nos seus interesses materiais e espirituais, constituem, em sua condição atual, um dado novo da vida social e política. Mas seu papel não estará completo enquanto não se identifique com os clamores dos pobres, contribuindo juntos para a regeneração dos partidos, inclusive os partidos do progresso.

Enquanto estes aceitarem as tentações do triunfalismo oposicionista e do oportunismo eleitoreiro, limitando-se às respectivas mobilizações ocasionais, estarão desgarrados do seu papel de formadores não apenas da opinião, mas da consciência cívica sem a qual não pode haver neste país política verdadeira. As classes médias brasileiras, mais ilustradas e, também, mais despojadas, têm agora a tarefa histórica de forçar os partidos a completar, no Brasil, o trabalho, ainda não terminado, de implantação de uma democracia que não seja apenas eleitoral, mas, também, econômica, política e social.
MILTON SANTOS
Folha de São Paulo,17/10/1999

segunda-feira, 20 de junho de 2011

O logo da copa 2014: o retrato do Brasil?

Mas uma ocupação de favelas: Medidas de segurança para o Povo ou para o dinheiro?

Da página do PCO

Neste domingo, dia 19 de junho, o governo do Rio de Janeiro, dirigido por Sérgio Cabral , aliado do PT e de Dilma, promoveu mais uma ocupação militar em um morro da cidade. O alvo desta vez foi o Morro da 
Mangueira, situado na zona Norte da capital fluminense.

A operação teve início às seis horas da manhã e foi concluída por volta do meio dia, quando militares do Bope anunciaram que já controlavam todos os pontos estratégicos da favela. Para ocupar o morro da Mangueira, foi utilizado um forte aparato repressivo, o que incluiu blindados do Exército e da Marinha e helicópteros da Aeronáutica. Foi a terceira vez que estes equipamentos militares foram utilizados em operações deste tipo. As outras duas haviam sido no Complexo do Alemão, em novembro de 2010, e no Complexo de Carlos, em fevereiro deste ano.

Foram utilizados 750 homens na operação.  Destes, 400 eram membros da Polícia Militar do Rio, que utilizou o Bope (Batalhão de Operações Especiais) e o Batalhão do Choque. Além deles, também participaram cerca de 150 militares da Força de Fuzileiros Navais e da Esquadra da Marinha. Estavam presentes  unidades da Polícia Civil, do Exército, da Força Aérea, Polícia Federal, do Corpo de Bombeiros e da Defensoria Pública do Estado

Imprensa capitalista esconde a operação de guerra contra o povo

Uma das principais propagandas realizadas pela imprensa capitalista para dar respaldo à ocupação do morro da Mangueira foi que, ao contrário de outras invasões,   supostamente não houve confronto entre os policiais e os traficantes durante a operação. Este tipo de propaganda serve para esconder da população a ação ditatorial realizada pela polícia, em particular pelo Bope, nas últimas semanas no Morro da Mangueira.
Há pelo menos um mês  vem sendo realizadas operações policiais com o objetivo de preparar a invasão e a ocupação militar. Em diversas oportunidades ao longo destas semanas os policiais foram denunciados por atirarem contra a população, prenderem  inocentes, agredirem e torturar moradores do locais, invadir de forma ilegal domicílios etc.

Para ocupar o morro da Mangueira outros dois morros próximos também foram invadidos pela polícia nas últimas semanas: o morro dos Telégrafos e do Parque da Candelária. Em ambos, os moradores fizeram as mesmas denúncias. 

Para se ter uma idéia, foram cumpridos quase cem mandados de busca e apreensão no Morro da Mangueira nas últimas duas semanas.
Neste período que antecedeu a ocupação, policiais do Bope controlaram a entrada da favela e passaram a vistoriar os moradores que quisessem  ntrar ou sair do morro. Tudo isto foi acompanhado do toque de recolher imposto pela polícia.

Desta vez, foi utilizada a seguinte tática: na véspera da entrada do Bope e do Exército foi “recomendado” (na verdade foi imposto) que ninguém saísse de casa. Ou seja, a favela foi completamente sitiada algumas semanas antes da entrada das tropas.

Neste sentido, dizer que a “ocupação ocorreu sem que nenhum tiro fosse disparado”, como afirmou o secretário de Segurança Pública do Rio, José Mário Beltrame, serve apenas para encobrir todos os crimes cometidos antes da ação realizada no dia 19 de junho.

Mangueira sob domínio do Bope

A ocupação da Mangueira foi comemorada pela polícia e o governo Sérgio Cabral, pois a militarização deste morro é um passo importante para colocar toda a cidade sob estado de sítio. A Mangueira fica situada em um local estratégico, há menos de 1 quilometro de dois dos estádios esportivos mais importantes que serão utilizados na Copa de 2014 e nas Olimpíadas  de 2016, o Maracanã e o Maracanãzinho.   

Fora isso, com a ocupação do morro da Mangueira fecha-se o chamado “cinturão de segurança da Grande Tijuca. A instalação de uma UPP no morro da Mangueira, a oitava naquela região, está prevista para ocorrer daqui aproximadamente 60 dias. Até lá, os policiais do Bope continuaram controlando o morro.

A ocupação desta área tem como objetivo expulsar a população pobre do local, realizando a política fascista de “limpeza social” na região para que esta receba investimentos capitalistas relacionados a realização à Copa e às Olimpíadas. Na Barra da Tijuca, por exemplo, estão previstos grandes investimento na área hoteleira. Entre os investidores está o grupo norte-americano Hyautt que anunciou na última semana a intenção de construir um hotel de alto padrão no bairro.

Ou seja, para atender os interesses dos capitalistas, a população está sendo expulsa violentamente de suas comunidades.
É preciso denunciar esta operação no morro da Mangueira como mais um passo do governo Cabral para sitiar completamente a cidade e colocar o Rio sob total controle do Bope e do Exército.

O texto acima foi retirado da página do PCO

A "Pacificação" e a Copa

O fato é que antes da escolha do Brasil ser escolhido para sediar a Copa de 2014 e as Olimpíadas a de 2016 pouco ou nada tinha sido feito para a tentativa de combate a violência, porém pós escolha resolvem pacificar as favelas, o porque disso?

É indiscutível a  necessidade do combate a violência tanto no Rio de Janeiro como em todo o país, mas essa operações de "pacificação" das favelas cariocas deve-se ao fato que uma das preocupações das organizações internacionais como também os investidores temem pela segurança dos turistas que visitarão o país durante os principais eventos esportivos do mundo.

O que quero dizer é que não podemos nos iludir com a falsa ideia passada pelo Estado e divulgada pela imprensa capitalista de que o Governo está preocupado com a população em si, mas na verdade eles sabem que se não forem tomadas medidas de combate a violência, a insegurança dos turistas poderão espantá-los e isso traria grandes prejuízos financeiros tanto para o Estado quanto para os empresários que investiram no evento. 

sábado, 18 de junho de 2011

Abaixo a ditadura

Da página do PCO

Os direitos democráticos da população estão sendo atacados profundamente pelos setores mais reacionários da direita que buscam aprofundar a ditadura que existe no país contra a classe operária e a população em geral

Estes setores controlam o Judiciário e a maioria dos poderes Executivos e Legislativos e servem aos interesses dos grandes monopólios capitalistas e da oligarquia rural. 
Mas não é apenas a direita que vem atacando os trabalhadores. O governo do PT, que procura se apresentar como de esquerda, adota as mesmas políticas ditatoriais. O governo petista nada mais é que uma boa fachada de esquerda para políticos de direita. Boa parte deles, remanescentes da ditadura militar como José Sarney.
Esta situação ocorre no Brasil em um momento em que a crise mundial do capitalismo impõe um ataque, sem precedentes, em todo o mundo, contra os direitos elementares da população do ponto de vista econômico, social e político.  
No Brasil, por exemplo, já se pode começar a ver os trabalhadores lutando contra esta situação. Nos últimos meses o número de greves cresceu consideravelmente. A repressão é uma tentativa da burguesia, do governo Dilma Rousseff e da direita de por um limite a este movimento de luta que, inevitavelmente, irá enfrentar o regime político burguês. 
Abaixo temos um resumo dos principais ataques contra a população ocorridos no último período.
Repressão a greve dos bombeiros e cassação do direito de greve
O governo Sérgio Cabral, aliado do PT, reprimiu brutalmente a luta dos bombeiros do Rio por melhores salários. No dia 3 de junho, quase 500 bombeiros, acompanhados de suas mulheres e filhos, ocuparam o quartel central da corporação, localizado no centro do Rio.
A resposta do governo Cabral foi mandar o Bope e a polícia desocuparem com extrema violência o local. Até mesmo tiros de fuzil foram efetuados contra os ocupantes. Vários manifestantes ficaram feridos e uma mulher sofreu um aborto por causa da ação.
Em seguida, o governo manteve preso por quase uma semana 439 bombeiros. Agora, todos eles serão julgados por um tribunal militar e podem até ser presos.  
Em São Paulo, juízes decretaram que as greves da CPTM e do metro eram ilegais. Um deles chegou a dizer que a greve só poderia acontecer se 100% da categoria estivessem trabalhando. Uma afronta contra um dos principais direitos dos trabalhadores.
Trata-se de uma política para cassar o direito de greve dos trabalhadores. 
Proibição e repressão a manifestações e greves
Em mais de uma oportunidade o Tribunal de Justiça de São Paulo tentou tornar passeatas como a “Marcha da Maconha” e a “Marcha da Liberdade” ilegais, proibindo que elas acontecessem, uma clara violação inclusive da Constituição nacional. 
Manifestações semelhantes foram proibidas em diversas cidades do País, da mesma forma que foram reprimidas atos contra o racismo no dia 13 de maio; passeatas de trabalhadores e estudantes estão sendo proibidas em diversas capitais e cidades do País.
A arbitrariedade chegou a tal nível que o comando da PM paulista chegou a anunciar que iria “proibir qualquer referência a maconha e outras drogas na Marcha da Liberdade”, ou seja, falar já passaria a constituir “um crime” passível de repressão pela ação policial. 
Assassinatos, prisões e torturas
Enquanto a direita reprime manifestações populares e ataca a liberdade de expressão, organização e manifestação o massacre no campo continua.
Em menos de um mês já foram assassinados cinco camponeses somente no estado do Pará por ordem dos latifundiários e madeireiros. 
Em todo o País, enquanto os assassinos e seus mandantes seguem impunes, centenas de lideranças dos sem terras e camponeses pobres seguem presos, torturados, ameaçados de morte e sofrendo perseguições de todo o tipo. O meso acontece na cidade com dirigentes sindicais, lideranças comunitárias etc.
O ataque mais recente ocorreu no dia 16, quinta-feira, com a prisão do líder sem-terra José Rainha e mais dez ativistas da luta pela reforma agrária.
Ocupação pelas forças de repressão das comunidades operárias e das Universidades
Nos últimos dias, valendo-se de uma ampla manipulação de episódios policiais pelos reacionários monopólios da imprensa burguesa, a direita aprovou a presença da PM no campus da maior e mais importante universidade pública do País (como nos tempos da ditadura militar), quase dois anos depois, que estudantes expulsaram a Policia que havia invadido a Universidade, como parte da luta por suas reivindicações contra a destruição do ensino público levada adiante pelos governos reacionários que defendem os interesses dos tubarões do ensino privado.
Em todo o País segue a ocupação de morros, favelas e bairros operários que, sob o pretexto de conter o aumento da criminalidade, aumentam a repressão contra a população trabalhadora, fazem crescer todo tipo de arbitrariedades contra famílias indefesas, incluindo a tortura e o assassinato de mulheres, crianças e homens inocentes.
Só a luta operária e popular pode colocar a ditadura abaixo
Contra esta situação chamamos todos os trabalhadores e suas organizações a realizar uma grande luta para colocar fim a todas as medidas ditatoriais.
Somente esta luta pode por abaixo esta ditadura estabelecida para atender aos interesses da burguesia nacional e do imperialismo.

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Quem é violento no meio rural?

 Por Rogério Tomaz Jr

Mais de 1600 assassinatos de lideranças ou militantes camponeses nos últimos 25 anos.

Em média, mais de um por semana.

E “os sem terra” é “violento”, “fora da lei”, “radical”.

Só nas últimas três semanas, seis mortes na Amazônia.

E “os sem terra” é “violento”, “fora da lei”, “radical”.

No último fim de semana, arrombamento da sede da CPT do Maranhão.

E o MST é “violento”, “fora da lei”, “radical”.

Duas semanas atrás, um líder quilombola, também no meu Maranhão querido, sofreu atentado a bala em sua casa.

E “os sem terra” é “violento”, “fora da lei”, “radical”.

Centenas de militantes e defensores de direitos humanos sofrem com ameaças de policiais, pistoleiros e da própria Justiça, como o advogado José Batista Gonçalves, condenado por fazer o seu trabalho de assessoria jurídica e tentar evitar conflitos que levassem pessoas à morte.

No 24 de maio passado, enquanto Sarney Filho anunciava com pesar o assassinato de José Cláudio, na tribuna da Câmara, os agroboys da Kátia Rebelo e do Aldo Abreu vaiavam nas galerias.

E “os sem terra” é “violento”, “fora da lei”, “radical” porque derruba pés de laranja.

Só no Pará, mais de 900 trabalhadores rurais ou apoiadores da luta campesina foram assassinados nos últimos 30 anos.

E “os sem terra” é “violento”, “fora da lei”, “radical”.

Em Pernambuco ou no Rio Grande do Sul, a Polícia Militar intimida (com bombas, sirenes e tiros), prende, espanca e tortura. Ou, simplesmente, executa. Como no Massacre do Eldorado dos Carajás.

E “os sem terra” é “violento”, “fora da lei”, “radical”.

Os movimentos propõem limite para latifúndios (existentes em muitos países “mudernos”) e atualização de índices de produtividade (defasados “apenas” em três décadas e meia) e o sabujo do Bóris Casoy lê editorial dizendo que a propriedade e o Estado de Direitos estão ameaçados no Brasil.

E “os sem terra” é “violento”, “fora da lei”, “radical”.

Tipo em Coqueiros, no Rio Grande do Sul, onde uma única fazenda ocupa 30% do município e gera 6 empregos, aí o MST ocupou várias vezes…

E é “violento”, “fora da lei”, “radical”.

A PEC que expropria terras onde existir trabalho escravo mofa há mais de década no Congresso Nacional, mas o Código da Motosserra que envergonha o Brasil no exterior é aprovado com folga em dois anos.

E “os sem terra” é “violento”, “fora da lei”, “radical”.

Mais de cinco mil pessoas de entidades e movimentos sociais que não aceitam a lei do latifúndio vivem e dormem com um ou dois olhos abertos, atentos a um tiro certeiro como bala que já cheira sangue.

E “os sem terra” é “violento”, “fora da lei”, “radical”.

Sem falar na ultra-esquerda (que, muitas vezes, fala para o próprio umbigo e para as paredes) que acusa o MST de ser governista ou recuado demais.